Millor Fernandes:


Jornalismo, por princípio, é oposição – oposição a tudo, inclusive à oposição. Ninguém deve ficar acima de qualquer suspeita; para o jornalista, não existem santos.

sexta-feira, 11 de novembro de 2016

Wilson Agostinho: Por que a esquerda chama de nazista qualquer um que se oponha a ela?



Por que os esquerdistas vivem chamando os outros de "fascistas"? Já vi esse rótulo colado nas figuras mais díspares: cristãos, liberais, conservadores, maçons, militares latino-americanos, anarquistas, social-democratas, muçulmanos - todo mundo. Nem judeus escapam: Menachem Begin e Arthur Koestler levaram essa carimbada umas dúzias de vezes.

De onde vem essa mania, essa necessidade compulsiva de dar a cada desavença, por mais mesquinha e estapafúrdia, o ar de um épico "combate antifascista"?

Detesto conjeturas psicológicas. Prefiro o método genético do velho Aristóteles. Em quase cem por cento dos casos, contar como as coisas começaram já basta para a plena elucidação de causas e motivos.

Até o princípio dos anos 30, os comunistas não ligavam muito para fascismo ou nazismo. Papai Stalin ensinava-lhes desde 1924 que esses movimentos eram apenas a "radicalização suicida da ideologia capitalista", prenunciando o "fim" do "império burguês" e a "vitória final" do socialismo. "O nazismo", dizia-se, "é o navio quebra-gelo da revolução." De repente, em 1933, partindo de Moscou sob o comando de Karl Radek, uma onda de antifascismo varreu a Europa sob a forma de livros, reportagens, congressos, passeatas, filmes, peças de teatro. Intelectuais independentes apareciam nos palanques ao lado dos poetas oficiais do Partido. Manifestos antinazistas traziam as assinaturas de estrelas do cinema.

Entre essas duas épocas, algo aconteceu. Adolf Hitler, eleito chanceler, preparava-se para grandes conquistas que requeriam o poder absoluto. Ansioso de eliminar concorrentes, e não podendo abusar do apoio recalcitrante do exército alemão, recorreu à ajuda da instituição que, no mundo, era a mais informada sobre movimentos subversivos: o serviço secreto soviético. A colaboração começou logo após a eleição de Hitler. Em troca da ajuda militar alemã, vital para o Exército Vermelho, Hitler era informado de cada passo de seus inimigos internos. O sucesso da "Noite das Longas Facas" de 1934 inspirou Stalin a fazer operação idêntica no Partido soviético: tal foi a origem do Grande Expurgo de 1936, no qual o serviço secreto alemão, já disciplinado por Hitler, retribuiu os favores soviéticos, descobrindo e forjando provas contra quem Stalin desejasse incriminar. O famoso pacto Ribentropp-Molotov foi somente a oficialização exterior de uma colaboração que já era bem ativa fazia pelo menos SEIS ANOS.

A onda mundial de histrionismo antifascista foi inventada por Karl Radek, em primeiro lugar, como vasta operação diversionista. Apenas um truque para jogar areia nos olhos dos antifascistas ocidentais, para que não percebessem a colaboração secreta, então cada vez mais intensa, entre a URSS e a Alemanha nazista, colaboração da qual o próprio Radek, no auge da campanha em carta confidencial a um amigo, confessava: "O que ali digo (contra o fascismo) é uma coisa. A realidade é bem outra. Ninguém nos daria o que a Alemanha nos dá. Quem imagina que vamos romper com a Alemanha é um idiota."(Cit. em Stephen Koch, Double Lives. Spies and Writers iin the Secret Soviet War of Ideas Against the West, New Yorkm The Free Press, 1994, p. 54.)

De Paris a Hollywood, idiotas pululavam entre os escritores e artistas. Arregimentá-los como "companheiros de viagem", criando a cultura do comunismo chique que até hoje dá o tom nos meios pedantes em países periféricos, foi o segundo objetivo da operação. Eram pessoas importantes, formadoras de opinião, que conservavam sua identidade exterior de "independentes", ao mesmo tempo que serviam obedientemente ao comunismo porque suas vidas eram controladas através de suborno, envolvimento e chantagem. Um exemplo entre centenas: André Gide, que era homossexual, durante anos não teve um companheiro de cama que não fosse plantado ali pela espionagem soviética. Quando se recusou a colaborar, a sujeira colecionada nos arquivos despencou em cima dele. Por análogos procedimentos, a espionagem soviética colocou a seu serviço André Malraux, Ernest Hemingway, Sinclair Lewis, John dos Passos e muitos outros, como também atores e atrizes de Hollywood, que, além do glamour, garantiam para Moscou um regular fluxo de dólares, moeda indispensável nas operações internacionais. O controle dos intelectuais era feito diretamente por agentes soviéticos, em geral à margem dos partidos comunistas locais, que por isto foram pegos de surpresa pelo pacto de 1939.

A terceira finalidade do "antifascismo" foi recrutar espiões nas altas esferas intelectuais. Alguns dos mais célebres agentes soviéticos, como Kim Philby, Guy Burgess, Alger Hiss e Sir Anthony Blunt, entraram para o serviço por meio da campanha. Conforme o combinado com Hitler, nenhum dos então recrutados foi usado contra a Alemanha nazista, mas todos contra os governos antinazistas ocidentais.

Comunistas, espiões e "companheiros de viagem" carregam pesada culpa pela mais sórdida fraude já montada por uma parceria de tiranos. Em suas mais notórias expressões, toda a cultura antifascista da época, o espírito do "Front Popular", matriz do antifascismo cabotino que ainda subsiste no Brasil, foi a colaboração consciente com uma farsa, sem a qual as tiranias de Hitler e Stalin não teriam sobrevivido a suas oposições internas; sem a qual portanto não teria havido nem Longas Facas, nem Grande Expurgo, nem Holocausto. O “Front Popular” foi um antifascismo de fachada inventado por Stalin para encobrir a ajuda que a URSS estava dando ao rearmamento do Exército alemão. Serviu também para desmoralizar a direita francesa, então a única voz (com a honrosa exceção do isolado e inaudível general de Gaulle) que defendia o fortalecimento militar da nação para fazer face à iminente agressão nazista, enquanto a esquerda e o centro queriam -— e obtiveram — o desmantelamento das Forças Armadas. Graças à campanha “antifascista”, Hitler pôde assim esmagar a França sem dificuldade, precisamente aliás conforme os cálculos de Stalin, que planejava usar os nazistas como pontas-de-lança para um ataque devastador às democracias ocidentais.

Desde a abertura dos Arquivos de Moscou que todo esse episódio está bem esclarecido. Mas o esforço conjunto de intelectuais, professores, jornalistas e idiotas úteis à serviço da ideologia socialista foi muito eficiente em ocultar da população uma descoberta histórica que ameaçava neutralizar o apelo hipnótico de um adorado mito stalinista.

Neurose, dizia um velho amigo meu, é uma mentira esquecida na qual você ainda acredita. A compulsão comunista de exibir "antifascismo" xingando os outros de "fascistas" revela o clássico ritual neurótico de exorcismo projetivo, no qual o doente se desidentifica artificialmente de suas culpas jogando-as sobre um bode expiatório. Nos velhos, é hipocrisia consciente. Nos jovens, é absorção simiesca de um sintoma ancestral que acaba por neurotizá-los retroativamente, fazendo deles os guardiães inconscientes de um segredo macabro.

Por isso, amigos, quando um esquerdista chamar qualquer um de vocês de "fascista", não se rebaixe tentando explicar que não é. Ninguém neste mundo deve satisfações a um colaborador de Hitler.


Bibliografia:

Stephen Koch, Double Lives. Spies and Writers iin the Secret Soviet War of Ideas Against the West, New Yorkm The Free Press, 1994, p. 54

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